Título: Risk of All-Cause Mortality in Diabetic Patients Taking b-Blockers (link)
Introdução: Estudos recentes sugerem que os β-bloqueantes podem
prevenir ou diminuir os efeitos adversos após um episódio de hipoglicemia grave,
contudo estes resultados não significam que o uso destes fármacos seja eficaz
em doentes diabéticos. Os efeitos adversos major dos β-bloqueantes incluem
risco de ocorrência de hipoglicemia grave (pois mascaram os sintomas precoces) e
aumento ponderal, fatores que podem condicionar aumento do risco cardiovascular
e morte. Assim, o uso de β-bloqueantes em doentes com diabetes pode estar
associado a um risco aumentado de mortalidade.
Objetivo: Analisar a relação entre o uso de β-bloqueantes e a
mortalidade por qualquer causa em doentes diabéticos e não diabéticos.
Metodologia: Este é um estudo
prospetivo de coorte, com uma amostra selecionada a partir dos registos do US
National Health and Nutrition Examination Survey (NHANES) recolhidos entre
1999-2010, e seguida desde a data da participação até 31 de dezembro de 2011.
O NHANES foi conduzido através de entrevistas em casa e avaliações em
centros médicos. Foram selecionados 17524 participantes com idades compreendidas
entre os 20 e os 79 anos.
A amostra foi dividida em doentes diabéticos e não diabéticos, que por
sua vez foram divididos consoante a toma β-bloqueantes (medicados e não
medicados). Adicionalmente foram também analisados os grupos de doentes com
antecedentes de doença coronária (DAC) e insuficiência cardíaca congestiva
(ICC). Foi criado um modelo de ajuste para inclusão de outras variáveis, consideradas
possíveis fatores de confusão, tais como o tabagismo, a hipertensão e duração
da diabetes.
O principal evento analisado foi a mortalidade por qualquer causa.
Resultados: Dos 17524
participantes, 2840 (16%) eram diabéticos e destes, 697 (25%) estavam medicados
com β-bloqueantes.
Nos doentes diabéticos o hazard ratio (HR) ajustado para a mortalidade
por qualquer causa foi 1.49 comparando os doentes medicados com β-bloqueantes
com os não medicados. Por outro lado, nos doentes não-diabéticos não houve
diferença significativa entre os dois grupos.
A mortalidade por qualquer causa nos doentes diabéticos com DAC foi
significativamente maior naqueles medicados com β-bloqueantes, quando comparada
com os não medicados (HR ajustado 1.64). Em contrapartida, nos doentes não
diabéticos com DAC a mortalidade foi significativamente menor nos medicados com
β-bloqueantes (HR ajustado 0.68). Para os doentes com antecedentes de Enfarte
Agudo do Miocárdio e ICC, o padrão encontrado foi semelhante (mortalidade
inferior nos não diabéticos e mortalidade superior nos diabéticos medicados com
β-bloqueantes).
Discussão: Os resultados reforçam as conclusões de estudos prévios,
indicando que em doentes não diabéticos com antecedentes de DAC e de ICC o uso
de β-bloqueantes diminui a mortalidade por qualquer causa. No entanto, não
existe evidência suficiente que comprove uma melhoria da sobrevida nos doentes
com DAC sem história de EAM e ICC com fração de ejeção conservada. Este estudo
demonstrou que em doentes diabéticos medicados com β-bloqueantes existe um
padrão inverso de mortalidade, sendo que esta foi significativamente maior em
doentes medicados com β-bloqueantes.
Limitações: Os dados deste estudo foram recolhidos entre 1999 e
2010, o que pode significar que os resultados não sejam aplicáveis às
terapêuticas antidiabéticas atuais. Os diagnósticos de DAC e ICC foram obtidos
através de informação transmitida oralmente pelos doentes, comprometendo a
fiabilidade dos dados. A adesão à terapêutica ao longo do estudo não pôde ser confirmada.
O período de follow-up não coincidiu com o início da toma de β-bloqueantes e
foi mais longo no grupo de diabéticos não medicados. Este foi um estudo
observacional prospetivo, sendo necessário a confirmação dos resultados através
de um ensaio clínico randomizado.
Análise: O controlo de fatores de risco cardiovascular em doentes
diabéticos influencia muito o seu prognóstico, sendo frequente depararmo-nos em
consulta com decisões complexas relativas à medicação que devem cumprir. Os β-bloqueantes
têm eficácia comprovada em doentes com antecedentes de EAM e ICC com disfunção
sistólica, aumentando a sua sobrevida, mas questiona-se o seu real benefício em
doentes diabéticos devido aos efeitos secundários potencialmente indesejáveis
nesta população.
Este estudo, apesar das várias
limitações encontradas na metodologia, alerta-nos para a possibilidade de
aumento da mortalidade em doentes diabéticos medicados com estes fármacos. No
entanto, são necessários mais estudos que comparem os outcomes de doentes que utilizem as novas classes de antidiabéticos
orais, e que se aproximem mais da prática clínica da atualidade.
Por Ana Rita Domingues, Inês Castilho, Mafalda Bento (USF AlphaMouro)